Informação do Conselho Tutelar da Região Norte de Campo Grande mostra que pai da menina de dois anos, morta por maus-tratos na última quinta-feira (26), buscou a guarda filha. Um Boletim de Ocorrência foi feito há um ano e apresentado ao Conselho Tutelar. Neste sábado (28) a menina foi enterrada.
De acordo com o Conselho Tutelar, na busca pela guarda da filha, o pai da criança tentou ficar responsável por ela. Ele foi encaminhado à Defensoria Pública e ao Conselho Tutelar, que realizou visita técnica, mas, na ocasião, a criança não tinha nenhum indício de maus-tratos. Nesta visita, foi constatada que a criança não tinha marcas e nem hematomas e, por ser muito pequena, não falava.
O Conselho Tutelar informou, ainda, que a mãe foi devidamente orientada quantos aos cuidados e proteção. No dia 8 de maio do ano passado o pai procurou o Conselho Tutelar e, mais uma vez, alegou que precisava de documentos de atendimento para apresentar à Defensoria. Outra vez, o pai disse que tinha visto hematomas na filha.
Diante da insistência do pai, o Conselho Tutelar e a equipe técnica realizaram uma tentativa visita à criança nos dias 7 e 8 de maio, porém, sem sucesso. Uma notificação de comparecimento foi deixada no dia 9 de maio, que, segundo o Conselho Tutelar, foi cumprida pela mãe da criança. Ela apresentou todos os documentos da criança, como, por exemplo, a carteira de vacina em dia.
Nesta apresentação, o Conselho Tutelar destacou que a criança estava bem cuidada e não apresentava nenhum sinal de maus-tratos ou marcas. O problema, segundo o próprio Conselho Tutelar, ocorreu quando foi feito o requisito de acompanhamento da criança na rede. Isso porque, quando foram fazer atendimento à criança, a mãe havia mudado de endereço.
Documentalmente, a avó materna da menina dois anos morta por maus-tratos – supostamente da mãe e do padrasto – está como testemunha do pai no Boletim de Ocorrência. Ele jamais foi chamada para ser ouvida.
Entenda o caso
A menina de apenas dois anos, que morreu na noite desta quinta-feira (26), em decorrência de sofrer maus-tratos por parte da mãe e do padrasto, deu um total de 30 entradas em diversos hospitais de Campo Grande.
Ao Correio do Estado, o médico pediatra Alberto Costa destacou que a quantidade de vezes que os pais terem levado a criança – cerca de 30 vezes – aos hospitais e um período de dois anos é, no mínimo, “fora do normal”, principalmente pelo fato de a menina não apresentar qualquer tipo de doença grave que exigisse acompanhamento médico constante.
“Esse número de atendimentos médicos que essa criança recebeu está anormal, principalmente para quem não tinha nenhuma doença grave”, disse Costa, que deixou claro que, nos casos em que o médico desconfia ou até mesmo constata, por meio de aspectos físicos, que a criança está sofrendo maus-tratos, a atitude mais acertada é acionar a Justiça para que providências sejam tomadas.
Conforme explicado pela titular da Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (Depca), Anne Karine Trevisan, em uma dessas idas ao médico, foi constatado que a menina tinha fraturado a tíbia, osso da perna que faz parte do joelho.
Já de acordo com a Secretaria Municipal de Saúde (Sesau), outra entrada, em outubro de 2022, aconteceu em decorrência de um quadro de vômito. A pasta não informou detalhes desta consulta ou de qualquer outro atendimento de urgência e emergência pelo qual a vítima passou.
A Sesau afirmou, ao Correio do Estado, que a equipe da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) no qual a criança deu entrada já sem vida, seguiu todos os procedimentos que eram de competência da unidade de saúde. A Sesau só não explicou porque o compilado de atendimentos médicos feito à criança não foi analisado, resultando em ações que poderiam ter colocado ela em proteção.
Na tarde da última sexta-feira (27), a mãe e o padrasto da criança tiveram a prisão convertida em preventiva vão ficar detidos. Os pais da criança são separados e, ao notar que a menina estava com hematomas e outros sinais de maus-tratos quando a visitava, o pai registrou boletim de ocorrência por suspeita de que sua filha estava sendo violentada.
Na Depca, a delegada Anne Karine Trevisan explicou que, quando morreu, a criança apresentava sinais de que poderia ter sido abusada sexualmente, mas apenas um exame necroscópico poderá confirmar a violência sexual.A mãe, de 25 anos, foi levada para a Delegacia de Pronto Atendimento Comunitário (Depac) para prestar esclarecimentos. À polícia, a mãe confirmou que a menina sofria agressões por parte dela e do padrasto, de 24 anos, como forma de corrigir o comportamento da menina.
Ainda em seu depoimento, a mulher afirmou que desconfiava de que o marido abusava sexualmente da menina, mas nunca denunciou porque o homem ameaçava tirar a guarda do outro filho, de um ano.
MPMS, UPA e vizinhos: o que está sendo dito?
O Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) recebeu a denúncia de maus-tratos que resultou na morte da criança de apenas dois anos, mas o caso foi arquivado. Assim, a denúncia não pôde seguir tramitação até o Poder Judiciário.
Há um ano, a mãe e o padrasto da vítima conseguiram um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO), que é um documento utilizado para crimes de menor potencial ofensivo.
Esse TCO foi registrado em janeiro do ano passado na 10ª Vara do Juizado Especial Central. No MPMS, a avaliação é de que não houve necessidade de dar andamento no caso e, por isso, a saída foi o arquivamento.
Na Unidade de Pronto Atendimento (UPA), a informação é de que criança já chegou morta. O documento aponta que o falecimento aconteceu pelo menos quatro horas antes.
Havia hematomas pelo corpo e sangramento pela boca. Também foram constatados os sinais de estupro na criança. Na rua onde a criança vivia, vizinhos relataram que ouviam sempre choros da criança com frequência.