Coronavírus atrapalha planejamento de atletas brasileiros para Olimpíada

Já são dezenas de eventos esportivos cancelados ao redor do mundo por causa do coronavírus e a lista aumenta a cada dia. Faltando menos de cinco meses para os Jogos de Tóquio, principal competição da temporada, a preocupação agora é tentar controlar a proliferação da doença e por isso as aglomerações de torcedores não são bem-vindas.

Só que cada torneio adiado, transferido de local ou cancelado mexe bastante com a preparação dos atletas. Muitos ainda buscam pontos no ranking, índices ou classificação para a Olimpíada e a Paralimpíada. Por causa disso, o coronavírus tem atrapalhado os competidores de elite, que precisam repensar agenda, alterar viagens e vivem a ansiedade de possíveis mudanças no calendário internacional.

O nadador Guilherme Costa, mais conhecido como Cachorrão, participaria neste fim de semana do Troféu Cidade de Milão. A competição seria o primeiro passo da preparação especial na altitude italiana, quando ele passaria 21 dias treinando em Livigno, a 1.816 metros acima do nível do mar. Mas após os inúmeros casos de coronavírus na Europa, a missão foi abortada. “A competição foi cancelada”, contou o atleta, que como opção vai adaptar em sua casa um equipamento do Comitê Olímpico do Brasil (COB) para simular a altitude em seu quarto.

O equipamento pode ser programado para simular até 2.800 metros de altitude. O aparelho conta com uma bomba, que tem um tubo para sugar o ar do quarto. Com esse mecanismo, o ar vai se tornando cada vez mais rarefeito, até chegar à “altitude desejada” – Cachorrão vai estabelecer 2.500 metros como referência. É como se todo o quarto se tornasse uma bolha, com característica única em comparação aos demais cômodos da casa.

“Tenho de ficar o máximo de tempo possível dentro do quarto pelos próximos 20 dias, para fazer mais efeito e simular a altitude. Vou ficar no mínimo 12 horas por dia assim. E vou aproveitar este tempo, já que não vou viajar, para fazer uma análise técnica para acertar minha virada nas provas.”

Quem também teve de mudar seus planos foi Alana Maldonado, que disputaria entre 6 e 17 de março um evento em Tóquio preparatório para os Jogos Paralímpicos. A competição foi cancelada e a delegação de nove pessoas não viajou. “É uma pena porque seria um evento-teste para a Paralimpíada e a gente iria ficar 10 dias depois lá treinando”, afirmou a judoca, que é líder do ranking em sua categoria. “Temos mais duas competições que valem pontos, na Inglaterra e no Azerbaijão.”

A situação foi pior para 20 nadadores paralímpicos, que competiriam em Lignano em um das etapas do circuito mundial. O evento foi cancelado e quando os atletas chegaram na Itália, incluindo o multicampeão Daniel Dias, receberam a notícia e tiveram de voltar para o Brasil.

Quem também vive uma situação inusitada é Hugo Calderano, do tênis de mesa. Ele precisa somar pontos no ranking mundial para tentar chegar em uma situação boa no evento olímpico para evitar cruzamentos precoces contra atletas chineses. As três próximas competições importantes são no Catar, na semana que vem, e depois no Japão e China. Apesar de não ter nada oficial, é possível que esses eventos sejam cancelados e, com isso, ele não poderia somar mais pontos.

“Estamos preocupados com as consequências para os eventos e principalmente para os Jogos de Tóquio. Mas confiantes de que o COI e o Comitê Organizador vão tomar as melhores decisões conforme as orientações da Organização Mundial da Saúde. O mais importante é preservar a segurança dos atletas, torcedores e todos os envolvidos”, comentou Calderano.

As últimas chances de classificação olímpica para brasileiros dos saltos ornamentais e nado artístico para os Jogos de Tóquio serão em dois eventos marcados para abril no Japão. Por enquanto não houve qualquer sinalização de cancelamento das competições, dada a importância delas, mas os atletas nacionais estão cientes dos problemas que podem ocorrer.

“Seguimos observando e nos planejando para as certezas e eventuais incertezas, mas até que seja confirmada uma mudança, nosso planejamento de treinamento segue igual. Estamos monitorando de perto este assunto, mas, por enquanto, vida normal, com cautela e seguindo todas as precauções”, explicou Tammy Galera, que vai tentar buscar sua vaga olímpica.

O Brasil vai enviar cinco atletas de saltos ornamentais e o dueto de nado artístico para tentar a classificação. Segundo o técnico Oscar Urrea, a Federação Internacional de Natação ainda não se pronunciou. “Estamos acompanhando as notícias, mas o nosso planejamento segue igual até que algo mude oficialmente”, diz.

A situação no skate é semelhante. O Mundial de Park, competição que dá o maior número de pontos para o ranking olímpico, será em Nanquim, na China, de 26 a 31 de maio. Dois eventos importantes da modalidade em abril, que seriam no país, foram suspensos. “Estamos atentos e em diálogo direto com a World Skate, inclusive para ajudar a encontrar soluções para o calendário”, explicou Eduardo Musa, presidente da Confederação Brasileira de Skate (CBSk).

Ele lembra que o mais importante é tranquilizar os atletas. “Ajustar a rotina de treinos não é o mais complexo. Certamente todo esse momento de expectativas e indefinições é o que requer nossa maior atenção. Entendemos que é um trabalho de preparação muito mais emocional que físico. Temos mantido um diálogo transparente e transmitindo as informações que recebemos sempre que há nova atualização. Mas, realmente, precisamos esperar o desdobramento das coisas.”

PRECAUÇÃO DO COB – O Departamento Médico do Comitê Olímpico do Brasil (COB) orientou os atletas e comissões técnicas a evitar viagens para China e Coreia do Sul. “São totalmente contraindicadas”, disse. A medida é mais rigorosa que as recomendações do Ministério da Saúde, que não inclui a Coreia como um destino a ser evitado.

A equipe médica da entidade elaborou um documento apresentando como se dá a transmissão do coronavírus e quais as formas de prevenir. O COB avisou que “seguirá as orientações das Federações Internacionais e definirá a participação em competições e treinos realizados em áreas de risco junto às Confederações Brasileiras Olímpicas.” O COB também garante que dará todo suporte aos atletas para não terem prejuízo em sua preparação.