Moro anuncia saída do ministério da Justiça e dispara contra Bolsonaro

Sérgio Moro, símbolo da operação Lava Jato, não é mais ministro de Justiça e Segurança Pública. A afirmação foi feita em coletiva de imprensa na manhã desta sexta-feira (24) e ocorre após a demissão do diretor da Polícia Federal Maurício Vareixo, publicada também nesta manhã.

O agora ex-ministro não deixou de fazer fortes críticas, diretas e indiretas, ao presidente Jair Bolsonaro.

Moro falou que desde 2014 nutre preocupação de interferência do Executivo na Polícia Federal, para impedir investigações. E destacou a autonomia da instituição, mesmo sob o governo petista. “O governo da época tinha inúmeros defeitos, uma corrupção gigantesca, mas foi fundamental a autonomia da PF”, afirmou.

Agora, porém, como ministro, Moro vê a interferência justamente do Executivo em cargos da Polícia Federal, anulando sua ‘carta branca’ presidencial.

Lembrou que 2018 foi convidado a ser ministro de Justiça e Segurança Pública por Bolsonaro, com compromisso de combate à corrupção e ao crime organizada. “Me foi prometido carta branca para nomear todos os assessores, inclusive desses órgãos, como a própria Polícia Federal”, contou. E garantiu que não buscava um cargo no Supremo Tribunal Federal, e sim um aprofundamento do combate à corrupção e a criminalidade.

“Única condição que eu coloquei, pode ser confirmada pelo presente, eu disse que eu estava abandonando a magistratura, pedi apenas que, já que nós íamos ser firmes contra a criminalidade, que se algo acontecesse, minha família não ficasse desamparada, foi única condição que coloquei”, confidenciou. “E o presidente concordou com todas (as condições), e falou até publicamente que eu teria carta branca”, completou.

Sérgio Moro lembrou o próprio currículo, como juiz, inclusive da Lava Jato, que – segundo ele – mudou o patamar no combate à corrupção no Brasil. “Foi um trabalho do judiciário, do Ministério Público e principalmente da Polícia Federal”, destacou.

O agora ex-ministro destacou a redução, sem precedentes histórico, nos índices de criminalidade sob sua gestão. 

“A partir do segundo semestre do ano passado passou a ver uma insistência do presidente na troca do comando da Polícia Federal”, afirmou Moro. “Sinceramente, não havia motivo (…) acabou ocorrendo a troca, mas por substituição técnica, junto com o diretor da PF, eu só indiquei o diretor, que é meu papel”. 

Moro disparou: “o que não é aceitável de maneira nenhuma são indicações políticas”. Sempre disse ao presidente, “eu preciso de uma causa (para trocar), relacionada à desempenho, erro grave”.

“Grande problema de realizar essa troca que seria uma violação da minha carta branca, e ficaria claro que estaria havendo uma interferência política na Polícia Federal”, disparou Moro. “Haveria também intenção de trocar superintendentes, como Rio de Janeiro”, cutucou ele, lembrando o reduto eleitoral de Bolsonaro, onde Flávio é investigado.
“Ontem quando conversei com o presidente, houve essa insistência, falei que seria uma interferência política, ele disse que seria mesmo”, cutucou mais.

“O grande problema não é questão de quem colocar, problema é o por que trocar, permitir que seja feita interferência política no âmbito da Polícia Federal”, disparou. “Presidente me disse mais de uma vez que quer uma pessoa que possa colher informações, conversar, e não é o papel da Polícia Federal, informações têm que ser preservadas”. “Presidente me disse isso expressamente”, completou.

“Informação de que Maurício Vareixo gostaria de saber não é totalmente verdadeira, claro que depois de tantas pressões ele de fato até manifestou a mim que ‘talvez seja melhor eu sair’, mas só decorrente dessa pressão”, rebateu Moro. “Não poderia deixar de lado meu compromisso com Estado de Direito”.

“Não assinei esse decreto (exoneração), fiquei sabendo pelo Diário Oficial”, revelou. “Não existe pedido, achei isso ofensivo. Para mim esse último ato é uma sinalização de que o presidente me quer fora do cargo.

“O meu entendimento foi que eu não tinha como aceitar essa substituição, há uma questão envolvida da minha biografia como juiz, da minha impessoalidade. Tenho que preservar o compromisso que eu assumi inicialmente com o próprio presidente de que seríamos firmes contra a corrupção, e o pressuposto disso é garantir a autonomia da Polícia Federal contra as interferências políticas”, sentenciou. “Vou empacotar minhas coisas e providenciar minha carta de demissão”.

Moro aproveitou para lamentar os mortos da COVID-19 pediu desculpas pela aglomeração na coletiva de imprensa de hoje.