Não é carinho: como e o que ensinar às crianças sobre os limites do contato físico com adultos

Nesta semana, vídeo publicado em rede social do cantor Wesley Safadão expôs um possível caso de assédio de um amigo do músico, que é pastor, ao abraçar uma menina. O assunto causou polêmica e várias pessoas passaram a pedir a investigação policial do caso. Mas como abordar o tema com as crianças e ensinar qual o limite do carinho?

“Se a criança não quer abraçar, não force”, é a afirmação da psicóloga clínica Kelly Pereira, ao notar que, no vídeo em questão, a menina chega se esquivar do suposto assediador. A profissional, que atua também com atendimento de crianças vítimas de abuso, lembrou a importância do diálogo dos pais com os filhos, desde pequenos.

“Em primeiro lugar, a criança deve ser orientada sobre carícias e toques diferentes. Os pais ou responsáveis devem explicar que, no corpinho delas, em algumas áreas, somente eles podem cuidar da higiene, por exemplo”, pontuou. Para a psicóloga, as orientações podem ser feitas a partir do momento que a criança compreende as partes do corpo, aos 3 ou 4 anos de idade.

Como dialogar?

Ainda conforme Kelly, o diálogo entre pais e filhos é primordial. “Eles precisam entender que esse assunto não é um tabu com os pais”, disse. Também, para os responsáveis, é importante observar o comportamento das crianças. “A criança que sofreu abuso ou violência sexual se retrairá e mudará o comportamento”.

Também para a psicóloga, é importante alertar que abraços que a criança perceba o órgão sexual do adulto ou toques em partes íntimas não devem acontecer de forma alguma e devem ser comunicados aos responsáveis. “Não devemos forçar as crianças a terem uma interação que ela não se sente confortável. Se ela não quer abraçar, não abrace”, afirmou.

Mudança de comportamento

A psicopedagoga, terapeuta e mestranda em neurociências, Glaucia Benini, ressaltou a possível mudança de comportamento de crianças vítimas de abusos. “A primeira mudança seria nos hábitos. Mudança de humor e até na rotina da criança”. Conforme Glaucia, também podem acontecer regressões. “Criança às vezes volta a fazer xixi na cama depois de muito tempo sem fazer isso, ou chupar o dedo. O comportamento infantilizado pode indicar que houve um abuso”, disse.

Também de acordo com a terapeuta, é importante analisar se a criança não quer ver ou ficar perto de determinada pessoa, ou ir a algum lugar. “A proximidade demais com uma pessoa também é preocupante”, ressaltou. Segundo a psicopedagoga, é importante analisar caso a criança apresente comportamentos sexualizados.

“Esse comportamento pode ser se a criança mostra a parte íntima, ou toca a parte íntima de outras pessoas ou dela mesmo. Isso muitas vezes acompanha um abuso físico que ela sofreu”, aponta Glaucia. Em qualquer caso, a família deve procurar uma ajuda profissional e sempre lembrar de introduzir o assunto com os filhos. “As pessoas têm dúvidas, para preservar a inocência das crianças, mas é imprescindível que desde pequenos entendam a diferença de qual parte do corpo é privada, que ninguém pode tocar”.

Temos que impor limites

Ao Midiamax, a acadêmica de psicologia e co-fundadora do Coletivo Elas Podem, Ladielly de Souza Silva, de 24 anos, lembrou a importância de impor limites sobre o corpo, desde a infância. “O Coletivo nasceu da necessidade de ter mais mulheres nos espaços de poder e na tomada de decisões. Isso implica também nesse assunto, para que as meninas possam ser o que quiserem e estejam seguras”, pontuou.

Com debates nas redes sociais, para que a informação chegue aos mais diversos lugares através da internet, Ladielly também ressaltou como a informação deve chegar até as crianças nas escolas e nos ambientes de convívio. “A maioria dos abusos acontecem dentro de casa, no ambiente familiar. Se onde é para a criança estar protegida, ela não está, quais outros espaços restam? Todos são responsáveis. Se viu que a criança ficou desconfortável tenho que me intrometer sim”, afirmou.

No vídeo amplamente divulgado, em que acontece o suposto assédio, ninguém chega a reprimir a atitude do pastor ao abraçar a criança. Mais ainda, o cantor Wesley Safadão foi às redes sociais para defender o amigo. “Homens sempre defendem homens. Mas é ainda pior porque é uma pessoa pública, com milhões de seguidores. Ele dá a possibilidade de duvidar da vítima. O ideal é ter investigação e que a criança seja ouvida e, na dúvida, se afaste a pessoa da criança”, ressaltou Ladielly.

Números de casos

Só em Campo Grande, de 1º de janeiro até o dia 28 de julho, foram registrados 203 casos de estupro de vulnerável. Em todo o Estado, foram 732, ou seja, mais de 3 casos de crianças estupradas chegaram até a polícia por dia em Mato Grosso do Sul. “É algo que acontece no dia a dia. A maioria das mulheres tem alguma história para contar de assédio, abuso ou estupro que sofreu”, disse Ladielly.

Os crimes contra crianças e adolescentes são enquadrados no artigo 217-A, do Código Penal, com pena de reclusão de 8 a 15 anos, podendo ter aumento ainda dependendo de cada caso.

Como denunciar?

Além dos canais da polícia, como o Disque 100 e o 190, é possível, em Campo Grande, buscar diretamente a Depca (Delegacia Especializada de Atendimento à Criança e ao Adolescente). O telefone para contato é o (67) 3323-2500 e a delegacia fica na Rua Dr. Arlíndo de Andrade, 145, no Amambaí.

Outro canal de denúncia pode ser o Conselho Tutelar. Confira os números dos Conselhos na Capital

– Conselho Tutelar Sul –  (67) 3314-6370 / (67) 3314-4482 (ramal 6103) / (67) 9 8403-2579

– Conselho Tutelar Norte –  (67) 3314-4482 (ramal 6100/6104) / (67) 9 8403-5485

– Conselho Tutelar Centro – (67) 3314-4337 / (67) 3314-4482 (ramal 6101/6105) / (67) 9 8403-2071 / (67) 9 8471-7947

– Conselho Tutelar Bandeira – (67) 3314-4482 (ramal 6121) / (67) 9 8403-2384

– Conselho Tutelar Lagoa – (67) 9 8472-9278 / (67) 9 8403-2804

Com informações do site Midiamax!