Excesso de cuidado, que nos primeiros momentos para a mulher pode ser a imagem perfeita do carinho, atenção e até amor, podem ser o primeiro alerta para uma relação tóxica. Nela, o homem trata a mulher como objeto que ele possui. Em casos extremos, como os do último mês em Mato Grosso do Sul, o homem possessivo não aceita perder ‘seu bem precioso’. Como um cachorro faz com seus pertences, ele mata e chega a enterrar as mulheres no quintal da própria casa.
A psicóloga Cláudia Malfati explica que esse é o comportamento de quem vê a mulher como um objeto, e que o ‘dono’ pode fazer o que quiser, inclusive destruí-lo, ‘se for preciso’. “É como se estivessem colocando a masculinidade deles (agressores) em xeque, já que eles perdem o controle de posse que possuem sobre as mulheres”, enfatiza a psicóloga. Malfati esclarece que os agressores fazem com que a vítima acredite que são elas as causadoras, inclusive, do inferno que os homens fazem elas passarem.
Ainda de acordo com a psicóloga, o processo começa com a destruição emocional da mulher, fazendo com que ela acredite que nunca ninguém irá amá-la do jeito que ele a ama, e depois vem a morte física. “’Eu mando, você obedece ou será punida’. Assim agem os agressores”, segundo Cláudia. “Cão que ladra, morde sim”, finaliza a psicóloga, que afirma que a qualquer sinal de violência, mesmo a verbal, é necessário relatar. A mulher precisa pedir ajuda.
Enterradas como objetos
Neste mês de agosto em Mato Grosso do Sul, três mulheres perderam suas vidas — que foram interrompidas por homens que não aceitavam o fim, que não aceitavam terem sido rejeitados pelos ‘objetos’, que consideram de sua propriedade.
Elas foram assassinadas e enterradas nos quintais de residências. Laís de Jesus Cruz, 29 anos, foi assassinada no dia 2 de agosto pelo marido, Pabilo dos Santos Trindade, de 34 anos, e teve seu corpo enterrado no quintal da casa onde moravam, em Sonora, a 361 quilômetros de Campo Grande.
Pabilo passou a noite lavando a casa para tentar esconder os vestígios de sangue, que havia sido deixado no local. Laís foi assassinada por um mata-leão e pancadas na cabeça. Ao lado do corpo estava uma concha de cozinha, que ela teria usado para se matar, segundo Pabilo, que negou ter matado a esposa. Ele contou que resolveu contratar alguém para cavar um buraco e enterrar o corpo da vítima já que ninguém iria acreditar na sua versão.
Elisiane Ferreira da Silva Alves, de 39 anos, desapareceu no dia 1º de agosto e seu corpo foi localizado três dias depois em uma vala rasa de uma propriedade rural, em Chapadão do Sul a 330 quilômetros de Campo Grande. Ela foi assassinada pelo companheiro, José Edison Ramo da Silva.
Após a sua prisão, José deu várias versões para o crime, chegando a afirmar que uma pessoa conhecida por ‘Baianinho’ havia assassinado Elisiane a pauladas em frente a casa, mas foi desmentido pelo patrão. O autor ainda foi questionado por qual motivo não havia registrado o boletim de ocorrência pelo desaparecimento da esposa, respondendo que era porque uma amiga de Elisiane já tinha feito.
Felipa Moreno Ojeda chegou a ir cinco vezes na delegacia para registrar boletins de ocorrência contra o ex-marido, antes de desaparecer em maio deste ano e seu corpo ser encontrado na tarde de quinta-feira (19), enterrado no quintal de uma casa, em Ponta Porã, a 346 quilômetros de Campo Grande.
O ex-marido e suspeito pelo crime está foragido. Os boletins de ocorrência começaram a ser registrados por Felipa em dezembro de 2012 quando foi agredida pela primeira vez. Em 2019, novamente Felipa voltou à delegacia para denunciar o homem, por ameaçá-la e agredi-la. Nos anos seguintes, 2020 e 2021 mais boletins de ocorrência foram registrados por ela contra o ex-marido por vias de fato, ameaça e violência doméstica.
Foi a irmã de Felipa quem procurou a delegacia após ela desaparecer sem deixar rastros em maio deste ano, data em que foi vista pela última vez no status do WhatsApp.