Sem câmeras, fraude na vistoria veicular ‘migra’ para pátio e implica servidores do Detran-MS

Servidores do Detran-MS (Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso do Sul) continuam burlando a legislação e ignorando um comunicado interno para aprovar no pátio do órgão veículos reprovados em vistorias realizadas nas ECVs (Empresas Credenciadas de Vistoria). Pelo menos 13 casos recentes foram denunciados oficialmente, mas não há informação sobre se já teriam saído da esfera administrativa.

As fraudes nas vistorias em MS teriam ‘migrado’ para dentro do Detran-MS porque o procedimento é feito de forma manual, sem registro por câmeras instituído nas vistoriadoras após flagrantes de irregularidades.

Nos casos aos quais o Jornal Midiamax teve acesso, a aprovação dos veículos no pátio ocorreu no mesmo dia ou, no máximo, no dia seguinte a uma reprovação em ECV. O fato é indicio de que houve um ‘jeitinho’ para ignorar as irregularidades, já que na maioria dos casos, não haveria tempo hábil para que os problemas serem corrigidos.

Além disso, a prática contraria a orientação disposta em CI (comunicação interna) emitida pela DIRVE (Diretoria de Registro e Controle de Veículos), distribuída em 20 de setembro de 2018. O documento determina que os servidores devem consultar a placa do veículo e identificar se houve vistoria reprovada em credenciadas nos últimos 30 dias.

Conforme a CI, caso a reprovação seja identificada, o usuário deverá ser “orientado a retornar à mesma empresa para que sejam constatados os devidos reparos no veículo”, o que ocorre sem cobrança de uma nova taxa de vistoria, desde que dentro do prazo de 30 dias da emissão do primeiro laudo de reprovação.

A ideia seria justamente coibir as tentativas de burlar o sistema. No entanto, a própria CI deixa uma brecha, pois prevê que, para os usuários realizarem a vistoria no Detran-MS, bastaria arcar com os custos de nova vistoria.

Aprovação suspeita

As evidências de fraude ficam mais fortes após ocorrerem busca de ressarcimento dos valores pagos às credenciadas onde houve a reprovação. A gravidade mora na impossibilidade dos proprietários terem efetuado os reparos em tempo hábil – muitas das aprovações no pátio ocorreram no mesmo dia, ou no dia seguinte, em que o laudo negativo foi emitido nas empresas.

Entre os casos de aprovações suspeitas ocorridas no pátio, estão veículos sem etiqueta de identificação VIS ou com etiqueta autodestrutível de assoalho com numeração ilegível ou incompleta – nesses casos, a reparação do item de identificação do veículo é feita apenas pela fabricante do veículo e o fornecimento de nova etiqueta demora entre 30 e 60 dias para ocorrer.

Outro caso, ainda mais grave, aponta pedido de ressarcimento de vistoria apenas um dia após reprovação de um veículo por indícios de fraude no chassi, devido a marcas de lixa ou abrasão. O pedido de ressarcimento ocorreu porque o veículo foi aprovado normalmente no pátio do Detran, horas depois. Outro caso também mostra que houve pedido de ressarcimento de vistoria após veículo ser aprovado no Detran-MS, mesmo estando com placa dianteira e traseira com tarjeta de municípios diferentes do registro

Até mesmo em caso de pneus desgastados, cuja a solução seria mais simples (a substituição dos itens por novos), proprietário preferiu pagar duas vezes a taxa, deslocar-se até o Pátio do Detran-MS, na rodovia MS-080, e posteriormente retornar à vistoriadora (na região central) para solicitar o ressarcimento.

Caos nas vistorias

Em julho de 2018, após constatação de que empresas credenciadas estariam fraudando vistorias em veículos sem condições de rodagem, foi publicada a Portaria 27, que aumentou as exigências técnicas e operacionais para as ECVs. Todavia, a norma estende-se apenas às empresas e o próprio órgão estadual segue desobrigado de cumprir as regras, como filmagem e fotografia dos procedimentos e adoção de sistema informatizado.

De acordo com a Portaria, as empresas devem filmar todas as vistorias com aplicativos informatizados homologados e instalados em tablets ou smartphones. A gravação deve documentar as condições dos pneus e estepe, vidros, retrovisores, faróis, lanternas, para-choques, portas, capôs, painéis laterais e outros itens.

Todos os vídeos devem mostrar a placa traseira do veículo, permitindo a identificação do mesmo e do vistoriador, mostrando seu rosto, nome legível e crachá.

No entanto, o próprio Detran-MS segue sem realizar o serviço de vistoria desta forma. Na época, o órgão frisou que a norma trata de obrigatoriedade apenas para as ECVs, mas que deverá adotar o mesmo sistema. “O Detran-MS reconhece a importância da automatização nas vistorias, inclusive, está em andamento o processo para a contração de empresa capacitada para tal”.

A reportagem questionou o Detran sobre as denúncias, sobre o andamento de processo licitatório para a implantação da nova metodologia de vistorias e aguarda posicionamento.